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Cisjordânia: Território Ocupado ou Disputado?

por Nina Avigayil Lobato
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A dura verdade é que Mike Pompeu, atual Secretário de Estado dos Estados Unidos, está certo. Ele está certo ao afirmar que os assentamentos israelenses não são necessariamente ilegais. Ele está certo ao afirmar que argumentar quem está certo e quem está errado, em termos de direito internacional, não vai trazer a paz às partes envolvidas no conflito. É uma brisa de bom senso.

Segundo Tucídides, autor da obra “A guerra do Peloponeso”, quando as partes envolvidas num conflito buscam razões na história para descobrir quem são os culpados pelo atual conflito, quase sempre elas se perdem num ciclo sem fim de ofensas passadas que não vão resolver o atual conflito.

Afirmar que a Cisjordânia é um território ocupado, por uma guerra de conquista israelense, como alguns antissionistas mais afoitos gostam de fazer, é um erro histórico e legal. Para tal afirmação estar correta, duas condições precisariam ser preenchidas: a Cisjordânia precisaria: primeiro, ser um território adquirido através de uma guerra de agressão e, segundo; o território em questão deve possuir uma entidade política soberana sobre si antes de cair sobre o controle israelense. Ou seja, é ilegal um Estado adquirir ou ocupar territórios de outros países com base na doutrina de conquista e através de uma guerra de agressão.

Segundo a Carta de São Francisco, um Estado só pode usar força contra o outro se tal uso tiver como propósito se defender de um ataque armado e se o Conselho de Segurança da ONU autorizar o uso da força (veja Capítulo VII - Artigos 40/ 41/ 51 da Carta de São Francisco e (Corte Internacional de Justiça no caso Nicarágua vs. EUA em 1986). Por que definiram a legitimidade do uso da força dessa forma? Entre outras razões, para tornar ilegal guerras de agressão como as que aconteciam entre França e Alemanha (séculos XIX e XX).

Outro elemento que deve chamar atenção do leitor é o quão vago “se defender de um ataque armado” pode ser. O que seria, operacionalmente, “um ataque armado” de um Estado inimigo neste caso? Hipoteticamente, se um Estado interromper uma movimentação de tropas e armas inimigas a 400 quilômetros das suas fronteiras e não dentro de sua fronteira, deixe de ser  um “ataque armado”? Não existe uma definição clara.

De fato, os israelenses poderiam ter nos poupado desse debate e simplesmente terem deixado o ataque armado do Egito, Síria e Jordânia, em 1967, chegar ao seu território. As consequências teriam sido apenas graves problemas econômicos, alto número de mortes e, até mesmo, destruição do Estado de Israel. Contudo, os estrategistas militares tem o péssimo hábito de nos lembrar dos limites impostos pela história e geografia, ou seja, nenhum Estado vai abrir mão da sua sobrevivência e da sua defesa porque existe um artigo, em um tratado de um órgão internacional (que pode ser incapacitado pelo poder de veto), que talvez proíba ataques preemptivos (não convém usar um sinônimo?)  que possam garantir a sobrevivência daquele Estado.

É óbvio que devido à natureza anárquica do sistema internacional, Estados, em especial, as superpotências tendem a utilizar seu poder militar contra outros Estados e atores não-estatais violentos de forma ilegítima. Dentro desse contexto, algumas pessoas afirmariam: Israel atacou Egito, Jordânia e Síria, em 1967, primeiro. Logo, Israel fez um ataque preventivo dentro de um contexto de Guerra de Agressão contra seus vizinhos, portanto ilegal pelo Direito Internacional.

Qual é o problema dessa afirmação? “Ataque preventivo”. Operacionalmente, um ataque preventivo possui uma janela de tempo mais longa para ser deliberado, autorizado e executado. Tem também o propósito de mudar a balança de poder entre dois ou mais Estados. O objetivo deste não é garantir a sobrevivência do Estado frente às ameaças imediatas. Um exemplo de ataque preventivo: Japão vs. EUA 1941.

No caso de Israel em 1967, operacionalmente, o ataque demorou cerca de três semanas para ser deliberado, autorizado e executado, bem como foi feito para lidar com ameaças reais, inevitáveis,  imediatas à sobrevivência do Estado de Israel. É importante notar que as doutrinas estratégicas de Israel tem preferência por autodefesa antecipatória e ataques antecipatórios, sendo eles de natureza operacional preemptiva ou preventiva, por razões geoestratégicas.

De acordo com a definição de uso legítimo de força pela Carta da ONU, ataque preventivo é claramente ilegal, mas não o ataque preemptivo devido à natureza imediata, inevitável e real da ameaça, bem como da proporcionalidade deste ataque. Note, no presente texto, eu não defendo a Doutrina Bush (2002), apenas o bom senso que St. Agostinho e Vattel tinham, segundo o qual ataques preemptivos fazem parte do costume do Direito Internacional e são legítimos, sendo, portanto, perfeitamente correto afirmar que a natureza preemptiva do ataque israelense, em 1967, foi uso legítimo de força.

Além disso, quando a Jordânia adquiriu o território que hoje é denominado Cisjordânia, através de um ato de agressão injustificado, em 1948, só dois países, Paquistão e do Reino Unido, reconheceram a soberania da Jordânia sobre este território anexado. Antes disso, esse território estava sob o controle do mandato britânico que, em 1948, o abandonou e, antes disso, sob o controle do Império Otomano, que implodiu depois da I GM.

Logo, quando Israel adquire (conquista) este território, em 67, não havia uma entidade política soberana (Estado) que tivesse legitimidade, através de um reconhecimento da comunidade internacional, sobre o território em questão. Neste contexto, o território denominado de Cisjordânia, parcialmente sobre a administração israelense e sob o qual tanto palestinos quanto israelenses podem clamar laços históricos é um território em disputa sob o qual Israel nunca estendeu a sua soberania. Os assentamentos israelenses, na zona C deste território, que não estão sob terras privadas (Azari Memluke do Código para Terras do Império Otomano de 1858) não são necessariamente ilegais.

Eu acredito que as discussões provocadas pelos dilemas oriundos da intersecção entre o direito internacional e o realismo político são ótimos exercícios intelectuais, especialmente quando ocorrem em um ambiente no qual existe honestidade intelectual, porque elas oferecem um espaço maravilhoso para ironias e reflexões sobre a natureza humana; contudo, concordo com o Mike Pompeu, elas não vão trazer a paz para israelenses e palestinos.

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